A cibersegurança vive hoje uma epidemia silenciosa. Trata-se do chamado Tool Sprawl, a proliferação desenfreada de ferramentas que, em vez de fortalecer a proteção das empresas, tem se tornado um risco real à eficiência operacional, à saúde financeira e à própria segurança.
Um levantamento recente mostra que organizações chegam a gerenciar entre 76 e 90 soluções distintas, criando um ecossistema fragmentado e complexo. Esse cenário é fruto de aquisições feitas sob pressão, diante de novas ameaças ou exigências de conformidade, somadas à expansão da superfície de ataque provocada pela transformação digital. O resultado é paradoxal: mais ferramentas, porém menos proteção.
Os prejuízos são claros. A subutilização é um dos mais alarmantes, apenas 10% a 20% das tecnologias adquiridas são de fato aproveitadas, enquanto o restante se torna shelfware, gerando custos de licença e manutenção sem retorno real. Além disso, a sobrecarga de consoles obriga profissionais a alternar constantemente entre sistemas, um processo que pode consumir até 9,5 minutos apenas para recuperar o foco. No dia a dia de um Centro de Operações de Segurança, isso se traduz em respostas mais lentas e riscos mais elevados.
No Brasil, o problema se intensifica. O país registrou 314,8 bilhões de tentativas de ataques apenas no primeiro semestre de 2025, o que representa 84% do total contabilizado na América Latina e no Canadá. A pressão desse cenário, somada ao déficit de profissionais qualificados, incentiva compras reativas de ferramentas que pouco se integram. O impacto financeiro é expressivo: o custo médio de uma violação de dados chegou a R$7,19 milhões neste ano, alta de 6,5% em relação a 2024. Setores como Saúde, Finanças e Serviços estão entre os mais atingidos, com valores que ultrapassam os R$11 milhões em alguns casos.
A dimensão humana também não pode ser ignorada. A fadiga provocada pela avalanche de alertas e pela complexidade de sistemas contribui para o esgotamento dos profissionais. Uma pesquisa da Proofpoint revelou que 73% dos líderes de segurança sofreram burnout no último ano, e a Gartner prevê que quase metade deles mudará de emprego nos próximos dois anos; um quarto, inclusive, deixará o setor.
Mesmo com investimentos crescentes, a Brasscom estima R$104,6 bilhões destinados à cibersegurança no país entre 2025 e 2028, a maturidade ainda é considerada intermediária. Embora o Brasil seja reconhecido como Tier 1 no Global Cybersecurity Index, pesquisa recente mostra que muitas empresas ainda operam de maneira reativa, com nível médio de maturidade de apenas 53%.
Frente a esse quadro, a resposta não está em multiplicar soluções, mas em racionalizá-las. O movimento conhecido como “plataformização” tem ganhado força: unificar diferentes ferramentas em sistemas integrados capazes de oferecer visibilidade ampla e operações simplificadas. Os resultados já são comprovados. Empresas que adotam plataformas conseguem detectar incidentes 72 dias mais rápido e contê-los 84 dias antes em comparação àquelas que mantêm ambientes fragmentados. O retorno sobre o investimento também cresce: 116% contra apenas 32% em organizações dependentes de múltiplos sistemas desconexos.
O “Tool Sprawl”, portanto, não é mais um problema técnico restrito aos especialistas. É um risco de negócios que mina defesas no exato momento em que os ataques se tornam mais sofisticados. Para líderes de segurança no Brasil e no mundo, a mensagem é clara: acumular ferramentas pontuais é insustentável. O futuro da resiliência cibernética depende da consolidação em plataformas integradas, que reduzem custos, simplificam processos e tornam as empresas mais ágeis diante de um cenário de ameaças em constante evolução.




